Crónica no Pataias à Letra, edição nº 20, setembro 2022
A valorização da floresta
Ao contrário de outros países, a floresta nacional assume
caraterísticas distintas: regime de monocultura (eucaliptais, pinhais – bravo
ou manso –, montado de sobro ou azinho); grande número de propriedade privada;
pequeno tamanho da propriedade florestal; ausência de cadastro. Por outras
palavras, os terrenos são pequenos, muitos deles não se sabe a quem pertencem e
são ocupados por uma única espécie arbórea, quase sempre em grandes manchas
contínuas.
Uma proposta para resolução do problema dos incêndios será
intervir nestes domínios.
O primeiro passo será a elaboração do cadastro florestal (identificação
e georreferenciação da propriedade), ou seja, saber «de quem é este terreno?».
Determinada a propriedade, será estabelecer uma política de
emparcelamento, agregando os pequenos terrenos florestais em terrenos únicos,
pois as novas propriedade florestais daí resultantes, pela sua dimensão,
permitirão uma gestão florestal mais eficaz. Quer coletiva, quer
individualmente.
De seguida, a elaboração de planos de gestão florestal que
contemplem áreas de produção florestal, áreas de proteção de biodiversidade e
áreas “tampão” para prevenção e combate aos incêndios. Esta gestão florestal
poderia ser agregada em grandes áreas através do que hoje se conhece como ZIF –
Zonas de Intervenção Florestal. Nestas ZIF, que agregariam os diversos
proprietários, a gestão florestal e os resultados da mesma obedeceriam ao
princípio da perequação, ou seja, uma receita total a ser distribuída equitativamente
pelos diversos proprietários em função da área respetiva.
Este princípio da perequação, adotado em grandes operações
urbanísticas, permitiria que numa vasta área territorial pudessem coexistir
diversas manchas arbóreas (homogéneas ou heterogéneas), com diferentes ritmos
de crescimento e «zonas tampão». Por exemplo, os proprietários das «zonas
tampão» apesar de não terem árvores, receberiam a sua parte do rendimento
florestal pois os seus terrenos são usados para proteger a restante floresta.
Só desta forma, através do ordenamento territorial e da
gestão florestal integrada, podem ser criados mecanismos de defesa da floresta.
Isso acabará com os incêndios? Não.
A profissionalização dos bombeiros, a existência estatal de
meios aéreos suficientes, a reorganização dos “guardas florestais” são outras
das necessidades prementes. O reconhecimento pelo Estado que a época dos
incêndios, dadas as nossas caraterísticas climáticas é, atualmente, de 1 de
janeiro a 31 de dezembro. À semelhança da educação e da saúde, não basta dizer
que são importantes: é preciso investir, reequipar, requalificar, aumentar
salários.
Finalmente, valorizar a floresta. A indústria de base
florestal e a produção silvícola valem cerca de 10 mil milhões de euros/ano, em
média (2016-2021), equivalente até 4% do PIB e até 7% das exportações. Há dados
que nos indicam que a área florestal tem diminuído cerca de 600 ha/ano. Mas a
grande questão coloca-se: destes milhões, quantos chegam às centenas de milhar de pequenos proprietários, responsáveis
pela produção florestal?
Para reflexão: durante grande parte do século XX, os fornos
da cal foram alimentados com mato e motano dos pinhais. Os pinhais, desde a sua
plantação até ao corte, significavam rendimento: no corte do mato, no motano,
na resina. A biomassa era gerida e o excesso retirado. Os proprietários
florestais recebiam por ter os pinhais. Atualmente, como é que é?
Durante esse período, quantos grandes incêndios florestais houve
em Pataias?
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