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sexta-feira, 20 de outubro de 2017

Registo dos grandes incêndios no Camarção de Pataias

José Bonifácio de Andrada e Silva, sócio das Academias Reais de Ciências de Lisboa (entre outras), foi no início do século XIX (mais precisamente entre 1802 e 1808), encarregado de dirigir as sementeiras e plantações nos areais das nossas costas, mais precisamente em Couto de Lavos (Aveiro), cujas terras de lavoura «estavam em perigo eminente de ser alagadas, e subterradas pelas areias do mar». Em 1815 editou a sua «Memória sobre a necessidade e utilidade do plantio de novos bosques em Portugal, particularmente de pinhais nos areaes da beira-mar; seu método de sementeira, costeamento e administração».

Neste trabalho, Andrada e Silva fez uma extensa caraterização dos areais da nossa costa, assim como do tipo de intervenção a realizar em cada um deles, em especial, das caraterísticas da vegetação a semear, das obras de proteção a realizar e dos custos previstos para tudo isso.

Referia no seu estudo, que entre a costa de Mira e Pataias, as dunas avançavam cerca de três braças (cerca de 6,5 metros) ao ano, havendo mesmo lugares em que as areias haviam avançado já mais de meia légua (o que em 1815 corresponderia a aproximadamente 3,3 km).

Identificando vários lugares muito húmidos, entre os quais a lagoa de Pataias, recomendava nesses lugares o plantio de Amieiros, Choupos e Salgueiros, em oposição aos pinheiros e «outras árvores de sequeiro», como lhe chamava. No «terrível camarção de Pataias», nos baixos e covas de charnecas arenosas, defendidas dos ventos Norte e Noroeste, colhia-se «bom centeio e milho grosso». Referia ainda que em 1769, a «vasta charneca arenosa do termo da Marinha Grande […] estava quase inculta; e havia perto de 3 milhões de braças quadradas [aproximadamente 1450 hectares] de baldio desaproveitado». Para se ter uma noção, as “Alvas” da freguesia de Pataias e Martingança tinham uma extensão total de 1079 hectares, em 1918, aquando a sua integração no Regime Florestal Parcial.

Em 1861, na sessão de 1 de julho, os deputados das Cortes são informados da carta «dos povos de Pataias, Brunhosa, Martingança e Moita, da freguezia de Pataias, concelho de Alcobaça, pedindo que se lhes permitta amanhar os baldios do pinhal nacional de Leiria». (ver: http://sapinhogelasio.blogspot.pt/2013/04/pataias-no-parlamento-em-1861.html).

Em 1917, a pedido da Câmara Municipal de Alcobaça, os baldios existentes na freguesia de Pataias e «cujas areias caminham à mercê dos ventos», são integrados no Regime Florestal Parcial, através do decreto 3264 de 27 de julho. Esses baldios são as denominadas «Alvas»: Alva de Água de Madeiros (60,49 hectares), Alva da Senhora da Vitória (306,20 ha), Alva da Mina do Azeche (213,61 ha) e Alva de Pataias (507,75 ha), perfazendo na época 1079,02 hectares. Hoje essa área atualmente é de “apenas” 864,60 hectares (ver mais em: https://sapinhogelasio.blogspot.pt/2015/08/as-alvas-da-freguesia-de-pataias.html). De referir, no entanto, que a Câmara Municipal fazia referência a 1092,76 hectares aquando o anúncio da delimitação dos respetivos polígonos.



A campanha de arborização das Alvas da então freguesia de Pataias é iniciada em 1918 e prolonga-se até 1936. 



No total, 1088 hectares são arborizados, sendo que desses, 9 hectares são rearborizações na Alva de Pataias.

Os grandes incêndios no Camarção (e nos pinhais da beira-mar)

1941
Em 1941 (21 e 22 de Agosto), ocorre o primeiro grande incêndio na freguesia, neste caso, no Pinhalinho. Curiosamente, em 1942 a empresa Pinhais do Camarção (constituída em 1919) é dissolvida e os terrenos são vendidos ao “Espanhol”. Provavelmente a dissolução da empresa e a venda dos terrenos terá sido uma consequência deste grande incêndio. (mais informações em: http://sapinhogelasio.blogspot.pt/2013/11/o-pinhalinho.html, http://sapinhogelasio.blogspot.pt/2010/11/o-pinhalinho.html, http://sapinhogelasio.blogspot.pt/2010/11/o-pinhalinho-e-cova-do-forno.html ).





1993
O segundo grande incêndio de que há registo ocorre já nos finais do século XX, mais precisamente em março de 1993. Durante alguns dias, 70 hectares de pinhal arderam na Alva da Senhora da Vitória «uma área maior do que todas as que têm ardido desde que a corporação [dos Bombeiros de Pataias] existem», escrevia Emídio de Sousa no Jornal de Pataias.



No mesmo ano de 1993, a 29 de Agosto, um incêndio na Alva da Mina do Azeche destrói 40 hectares de pinhal e mato e duas barracas de madeira junto a Vale Furado.



1994
Em 1994, a 15 de abril, são consumidos pelo fogo 110 hectares de mato e pinhal na zona do Vale Fundo e Figueirinha. Combatem o incêndio florestal 126 bombeiros e 17 viaturas.



2010
Em 2010, a 27 de julho, ardem 30 hectares na Alva da Senhora da Vitória, entre o Vale de Paredes e o Pinhalinho.  Foram envolvidos 126 homens, 33 viaturas e 3 meios aéreos.
(Ver: http://sapinhogelasio.blogspot.pt/2010/07/incendio-na-alva-das-paredes-da-vitoria.html).

2015
Em 2015, a 7 de Agosto, um incêndio na Alva de Pataias destrói 146 hectares de floresta. São envolvidos 387 operacionais, 144 veículos terrestres, 4 meios aéreos, 2 máquinas de rasto e tem a duração de 3 dias. Os utentes e residentes da ABEOTL de Pataias são evacuados. Os 146 hectares correspondem à área compreendida entre a “curva da morte” e as piscinas de Pataias, entre a Lagoa e os Outeirões.
(Ver: http://sapinhogelasio.blogspot.pt/2015/08/alva-de-pataias-mais-de-150-hectares.html).

2017
Em 2017, 15 de Outubro, incêndio florestal iniciado na Légua e que se estendeu (e ultrapassou) o limite norte da freguesia com o concelho da Marinha Grande. O fogo atingiu uma área de mais de 3000 hectares, apenas na União de Freguesias de Pataias e Martingança.
O fogo iniciado na Légua foi combatido por 97 bombeiros, 35 viaturas e 1 meio aéreo. O fogo iniciado na Burinhosa  contou com 355 operacionais e 112 viaturas.
Ao todo, este grande incêndio nos concelhos de Alcobaça, Marinha Grande e Leiria, destruiu 18536 hectares, dos quais 70% de pinhal, 27% de matagais de transição (mato – pinhal) e apenas 1% de áreas agrícolas.
(Ver: http://sapinhogelasio.blogspot.pt/2017/10/o-grande-incendio-para-memoria-futura.html).

Coincidência (ou talvez não):
Em agosto de 2015 estávamos numa situação climatológica classificada de "seca severa", em outubro de 2017 estamos em "seca extrema".
(Ver: http://sapinhogelasio.blogspot.pt/2015/08/incendio-na-alva-de-pataias.html).

Nota: Um muito obrigado ao Tiago Inácio que descobriu parte da informação e disponibilizou os recortes dos jornais.

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