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terça-feira, 4 de setembro de 2012

Fornos de Cal – Património Histórico


Na edição de setembro de 2012 do "Pataias à Letra", mais um excelente trabalho do Tiago Inácio.


Fornos da cal - Património Histórico


Contextualização histórica
 

Embora não seja conhecida a data da instalação dos primeiros fornos, deverão ter surgido no séc. XIX, onde já desempenhavam um papel importante na industrialização de Pataias. Alcobaça é no início da segunda metade do Séc. XIX, o concelho do distrito que mais fornos possui em laboração, onde se contabilizam 22, descendo para 19 em 1877 e 13 em 1890.
Seguramente que a inauguração da rede férrea – linha do oeste – em 1888, veio dar um novo rumo à indústria de cal em Pataias. Desta forma, Pataias possuía uma série de características únicas, que permita o crescimento abrupto da indústria de cal: A pureza da Pedra calcária que ronda os 97,8%, a abundância de material lenhoso, para a alimentação dos fornos e a linha férrea para escoamento do produto final.
No entanto, devido à clandestinidade que a indústria vivia no séc. XIX, apenas foi possível descobrir um licenciamento relativo à laboração de um forno duplo de cal em 1909, propriedade de Manuel Serrano de Figueiredo. No Jornal Ecos de Alcobaça de Julho de 1929, é-nos dado a conhecer um pouco de Manuel Serrano de Figueiredo, que terá sido o grande impulsionador da indústria de cal: “O seu espírito paira junto de todos aqueles que se interessam pelo progresso desta terra. Sem a sua iniciativa, a Industria de cal em Pataias, não passaria de rudimentares experiências nem teria alcançado o desenvolvimento que alcançou (…). À sua iniciativa e persistência se devem o desvio e apeadeiro do Caminho-de-ferro”. O dito desvio que é mencionado, era um ramal que ligava as pedreiras aos seus fornos, construída por Manuel Serrano de Figueiredo e seu Irmão (Serranos, Lda). As vagonetes, depois de carregadas eram empurradas pelos homens até ao forno. Tarefa esta possível devido ao desnível do terreno. De salientar ainda, quedevem aos Irmãos Serranos o planeamento e fundação da “Empreza Vidreira de Pataias”. 


Anúncio no jornal "Ecos do Alcoa" nº34 de 13 de janeiro de 1929

Através da análise da Tabela, é possível verificar que a produção de cal atingiu o seu apogeu em 1933.
Ano    Fornos
1929    20
1933    35
1942    25
1950    17
1982    5
1994    1
O último forno, deixou de laborar a 30 de Junho de 1995.


 
O último forno a cozer cal. Um incêndio precipitou o encerramento da atividade.

Processo de fabrico de cal
 

Em primeiro lugar, era necessário extrair a pedra. Grande parte dos proprietários, possuíam as suas pedreiras particulares ou então extraiam da pedreira pública nos terrenos baldios da freguesia, local conhecido como Ratoinha.
À medida que a pedra era transportada para a entrada do forno, era altura de realizar o empendre que começava com o assentamento das armadeiras (pedras que partiam do peal que rodeava o interior do forno, até formar uma espécie de abóbada). Cada fornada levava cerca de 150 carradas de pedra. Demorava entre 5 a 10 dias a cozer, e a produção variava entre 50 a 60 toneladas por fornada. A cal era depois vendida à boca do forno, e o que não fosse vendido, era armazenado.

Entrevista
 

António Sebastião Grilo, actualmente com 72 anos, geriu o último forno a laborar em Pataias. A sua última fornada data de 30 de Junho de 1995.

António S. Grilo a conduzir uma junta de bois com uma carrada de mato para os fornos da cal

A produção de cal, é uma tradição na sua família. Como tudo começou?
“Joaquim Vieira Grilo, meu pai, começou a trabalhar na cal na altura em que se casou, em 1933. Nessa época trabalhava à jorna para alguns proprietários de fornos. Algum tempo depois, por volta de 1935, o meu pai e o cunhado construíram um forno. Passado alguns meses construíram outro forno, e assim cada um ficou com um. Mais tarde já por volta dos anos 60, o meu pai comprou um forno ao Leão.
O meu pai no princípio tinha uma pedreira dele, que mais tarde vendeu à Cibra, a partir daí passa a extrair da pedreira da mata que era propriedade da Junta.”
Quando começou a trabalhar na cal?
“Eu comecei trabalhar no forno de cal do meu pai quando saí da 4ª Classe aos 11 anos.
 As minhas tarefas eram na parte dos transportes de caruma e de pedra.”

Em que anos se atingiu o auge da venda de cal?
“Foi nos anos 60, altura em que ia muita cal para a siderurgia nacional.”

Quantas pessoas chegou a empregar?
“Depende das alturas, mas talvez no máximo tenham sido umas 6”

Quantas fornadas faziam por ano?
“Nos últimos anos deviam de ser uma média de 7, em outros tempos chegaram a ser 12.”

Houve alguma modernização no processo de fabrico de cal ao longo dos anos?
“A cal trabalha sempre nos mesmos moldes, os transportes é que eram diferentes, primeiro eram os carros de bois, depois mais tarde vieram as camionetas já para o final dos anos 50”

Quando começou a gerir os fornos?
“Deu uma trombose ao meu pai em 1984, a partir daí geri os fornos até ele falecer em 1993, e só dois anos depois, em 1995, cessei a actividade”

Em que localidades vendia Cal?
“O nosso maior cliente, a quem vendemos até fechar estava sediado em Torres Novas. Também vendi muito para Torres Vedras.”

O que acontecia quando um forno fechava?
“Quando fechava um, os outros conseguiam ir dando resposta ao mercado”

Porque motivo cessou a actividade?
“Já não dava rentabilidade, e era difícil arranjar pessoal por ser um trabalho difícil”

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